segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Incra estabelece meta de titular 53 comunidades quilombolas até 2010

O Incra definiu a meta de regularização fundiária em áreas quilombolas, com a emissão de 53 títulos definitivos até 2010. Ainda este ano, 11 comunidades devem ser tituladas. Nestas 11 comunidades, 885 famílias remanescentes de quilombo serão beneficiadas com a posse definitiva de cerca de 20 mil hectares de terras.

Em 2010, o Incra está projetando encaminhar para a Casa Civil, da Presidência da República, os processos de mais 42 comunidades quilombolas. A área total destas 42 comunidades tem pouco mais de um milhão de hectares, que serão repassadas para a posse de 7.301 famílias quilombolas. Após a decretação das áreas como comunidades remanescentes de quilombo, pela Casa Civil, o Incra promove a desintrusão (retirada) dos não quilombola e emite o título definitivo.

Das 11 comunidades que devem ser tituladas ainda em 2009, cinco ficam no Rio Grande do Sul e duas no Pará, sendo que São Paulo, Rondônia, Maranhão e Alagoas têm uma área quilombola cada.

De acordo com a coordenadora-geral de Regularização de Territórios Quilombolas do Incra, Givânia Silva, a expectativa é grande no cumprimento das metas. “Vamos operar no sentido de minimizar as dificuldades para agilizarmos as titulações. A Coordenação, em Brasília, está trabalhando integrada às Superintendências Regionais do Incra em todo o Brasil a fim de realizar todos os procedimentos e acelerar os processos”, afirma Givânia.

Reunião

A definição das metas ocorreu na segunda-feira (27), durante reunião na Presidência da República, em Brasília, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, do presidente do Incra, Rolf Hackbart, e de mais 10 ministros, entre outras autoridades ligadas à questão quilombola no Brasil.

Hackbart fez uma apresentação da atuação do Instituto em relação à regularização de territórios quilombolas durante o atual governo. Pelos dados apresentados, 851 processos foram abertos nos últimos seis anos, sendo que foram publicados 87 editais com Relatórios Técnicos de Identificação e Delimitação (RTID) de comunidades quilombolas.

Os dados citam ainda a publicação de 45 Portarias de Reconhecimento de Comunidades Quilombolas e a emissão de 38 títulos definitivos – 11 pelo Governo Federal e 27 em parceria com os estados do Pará, Piauí e Maranhão. A emissão dos 38 títulos beneficiou 3.338 famílias remanescentes de quilombo, com a posse de 303 mil hectares de terras.

Na terça-feira (28), outra reunião também em Brasília, só que na Sede do Incra, contou com a presença dos superintendentes e técnicos de 17 das 30 Superintendências Regionais do Incra em todo o país. Nesse encontro, foi detalhado o plano de ação da autarquia para atingir as metas já estabelecidas e pactuadas junto à Presidência da República para regularização de comunidades quilombola até 2010.

Brasil Quilombola

O Programa Brasil Quilombola, criado em 2004, tem como finalidade a coordenação das ações governamentais para as comunidades remanescentes de quilombos, com ênfase na participação da sociedade civil. O Programa é coordenado pela Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), ligada à Presidência da República, e tem suas ações executadas por 23 órgãos da administração pública federal, além de empresas e organizações sociais. O Incra é o responsável pela regularização fundiária das comunidades quilombolas.

O Programa também estabelece interlocução permanente com os órgãos e entidades no intuito de descentralizar e agilizar as respostas do governo para as comunidades remanescentes de quilombos. Os governos municipais têm, neste contexto, uma função singular por se responsabilizarem, em última instância, pela execução da política em cada localidade.


Portal do Ministério do Desenvolvimento Agrário

domingo, 12 de julho de 2009

Lei da Grilagem viola direitos de comunidades tradicionais

PGR questiona lei que trata da regularização fundiária na Amazônia

Chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4269), proposta pela procuradora-geral da República, Deborah Duprat, contra artigos da Lei 11.952/2009, que dispõe sobre a regularização fundiária das ocupações em terras situadas em áreas de União na Amazônia Legal.

Deborah Duprat sustenta que, em diversos pontos, a lei questionada se afastou de seus objetivos principais, que seriam promover a inclusão social e a justiça agrária - dando amparo a posseiros de boa-fé, que retiram da terra o seu sustento; e aperfeiçoar o controle e a fiscalização do desmatamento na Amazônia - por permitir uma melhor definição dos responsáveis pelas lesões ao meio ambiente nas áreas regularizadas.

Privilégios

Para a procuradora-geral, a norma institui privilégios injustificáveis em favor de grileiros que, no passado, se apropriaram ilicitamente de vastas extensões de terra pública. Segundo ela, essas grilagens frequentemente envolveram emprego extremo de violência, uso de trabalho escravo e degradação, em grande escala, do meio ambiente.

Com a lei, diz Duprat, essas terras serão transferidas para particulares, de forma gratuita ou em condições econômicas bastante vantajosas, sem a necessidade de realização de prévio procedimento licitatório. “Foi legalmente autorizada a apropriação privada de valiosíssimo patrimônio público”, afirma a procuradora.

Indígenas e Quilombolas

Além disso, em alguns pontos, acrescenta Deborah, o legislador deixou de proteger a Floresta Amazônica brasileira – um patrimônio nacional, bem como os direitos de minorias étnicas como os povos indígenas, os quilombolas e as populações tradicionais que habitam na região.

E a violação do direito dessas minorias às suas terras é inconstitucional, diz a ADI. Da forma como foi aprovado, revela a ação, o dispositivo questionado sugere que terras tradicionalmente ocupadas por comunidades quilombolas e tradicionais podem ser regularizadas em favor de terceiros, diferentemente do que ocorre com as terras indígenas. De acordo com a procuradora-geral, “tal interpretação afronta a Constituição, em especial o seu artigo 216, pelo qual está suficientemente claro que o exercício de direitos culturais não é uma prerrogativa de povos indígenas”.

Recuperação ambiental

De acordo com Deborah Duprat, “o Supremo deve declarar que o aproveitamento racional e adequado, aludido no preceito em questão, envolve também o dever de não provocar qualquer tipo de desmatamento irregular na área regularizada, bem como o de também recuperar as lesões ambientais causadas pelo ocupante ou por seus antecessores antes da regularização fundiária”. Ela ainda explica que essas providências são imposições da Constituição, diante do dever do Estado de defender o meio ambiente.

A procuradora-geral ainda questiona os parágrafos 4º e 5º, do artigo 15 da lei em questão, por violação da igualdade e desvio de poder legislativo. Ela explica que os dispositivos determinam que para as áreas regularizadas de até quatro módulos fiscais, o prazo de inalienabilidade fixado pelo legislador é de dez anos, enquanto as áreas que tenham entre quatro e quinze módulos fiscais, o prazo é de três anos. Para Deborah Duprat não há qualquer justificativa legítima, calcada em interesse público para a diferenciação. “Pelo contrário, tem-se uma flagrante discriminação, que beneficia os que menos precisam, e ainda favorece a especulação imobiliária na Amazônia, às custas do patrimônio público”, destaca a procuradora-geral.

Pedido

Deborah Duprat pede que seja afastado o entendimento de que é possível a regularização, em favor de terceiros, de áreas ocupadas por remanescentes de quilombos ou outras comunidades tradicionais – incluindo as áreas necessárias à reprodução física, cultural, social e econômica. Pede, ainda, que seja reconhecida a necessidade de vistoria prévia para a regularização fundiária de que trata a lei e que as áreas regularizadas não sejam desmatadas. Por fim, pede que seja de dez anos o prazo de inalienabilidade das áreas regularizadas entre quatro e 15 módulos fiscais.


Fonte: STF e Consultor Jurídico em 09/07/2009

quinta-feira, 9 de julho de 2009

um quilombo aposta no desenvolvimento sustentável


Imersas na maior área contínua da Mata Atlântica brasileira, 92 famílias lutam para preservar os recursos naturais, a cultura e a organização socioeconômica tradicionais.


No Vale do Ribeira, no Estado de São Paulo, 267 km ao sul da capital, está instalado desde o início do século XVI o quilombo de Ivaporunduva. Fica ao longo da estrada que liga os municípios de Eldorado e Iporanga, às margens do Rio Ribeira do Iguape. A comunidade local é formada por quase 500 quilombolas que apostam no turismo e no artesanato, além da produção e comercialização da banana orgânica, como as principais fontes de renda.


Entre os pouco mais de 30 quilombos que se espalham pelo vale, Ivaporunduva é um dos mais visitados, já que possui o mais consistente programa de turismo ecológico para receber visitas de turistas, grupos escolares e pesquisadores. O cultivo tradicional de roça garante a sobrevivência da comunidade com a produção orgânica de arroz, mandioca, milho, feijão, verduras, legumes e pequenas propriedades pecuárias.


“As refeições da nossa comunidade são 99% orgânicas. Não se pode dizer que é 100% porque compramos alguns produtos, como óleo e sal, e não podemos garantir sua procedência”, explica Benedito Alves, coordenador da Associação dos Moradores do Quilombo de Ivaporunduva. Aos 54 anos, Alves se gaba de nunca ter sofrido de uma doença grave, uma saúde mantida à base de alimentos naturais. “Para casos pequenos como dor de cabeça, temos nossa farmácia natural que cresce por todo o lado”, completa sorridente.


Todos produzem, todos ganham
A economia do quilombo está organizada sob o sistema de cooperativa, da qual todas as famílias são associadas. Os produtos são comercializados em diversas regiões do Estado. “Estabelecemos um sistema de cotas por família. Desse modo, garantimos que todas as famílias tenham rendimentos da produção da banana orgânica, do artesanato local e das receitas do turismo”, explica o gestor ambiental Paulo Pupo, quilombola local e coordenador de turismo.


“É claro que queremos que nossa produção seja mais eficiente, mas só vamos apostar em tecnologias limpas para preservar a relação de respeito que nosso povo tem com os recursos naturais como a terra, água e a mata”, garante Benedito Alves. “Não vamos fazer nada que vai agredir essa riqueza que temos aqui.”


Cada uma das atividades é gerida por uma coordenadoria que se encarrega das certificações (banana orgânica), licenciamento e patentes (artesanato), formação e gerenciamento de técnicos locais que trabalham como guias turísticos, além dos contatos e o fornecimento da mercadoria em várias cidades.


Pupo acredita que tem crescido a consciência dos consumidores brasileiros em relação à oportunidade que cada um tem de contribuir para a sustentabilidade do planeta. “As pessoas que compram nosso artesanato, por exemplo, se emocionam ao saber do trabalho social que está por trás dele e sempre recomendam os produtos a mais pessoas”, revela.


Infra-estrutura avança
As raras residências se espalham em um raio de aproximadamente cinco quilômetros quilombo adentro e estão conectadas por estreitas estradas de terra abertas entre a mata verde. Elas são em sua maioria construídas de pau-a-pique, apesar do número considerável de casas de alvenaria que começam a surgir. O sistema de esgotos ainda é precário, mesmo sendo uma das prioridades de melhoria da atual gestão, segundo Alves.


Às quartas-feiras, um caminhão da prefeitura recolhe o lixo reciclável, cuja quantidade tende a aumentar devido ao emergente comércio local de alimentos processados. Uma ponte sobre o Rio Ribeira do Iguape está em fase de construção. Até 2012, ela deve substituir um pequeno barco e uma balsa que fazem a travessia de pedestres e de pessoas motorizadas. Os moradores acreditam que, com a facilidade de acesso, vai aumentar o número de visitantes à comunidade.
Educação, tecnologia e inclusão digital.


Os investimentos da prefeitura local e as parcerias com diversas entidades renderam uma escola de ensino fundamental, um posto de saúde local e a instalação de um telecentro comunitário com computadores ligados à internet, permitindo a inclusão digital da comunidade. Hoje, a cada fim de tarde, os jovens se dividem entre assistir televisão, acessar a internet ou participar das centenárias rodas de histórias contadas na praça central em volta da fogueira.


“A diversidade que temos hoje não são uma ameaça à nossa cultura, até porque boa parte de nós já morou em cidade grande por muito tempo, mas quase todos retornaram. Nós não somos contra as tecnologias e cada um é livre para fazer o que quiser”, defende o quilombola Laudo Furquim, que hoje trabalha na coordenadoria de turismo depois de uma experiência de seis meses no ramo da construção na cidade de São Paulo.


Benedito Alves reforça a necessidade de parcerias e investimento em novas tecnologias, desde que elas ajudem no desenvolvimento local. Segundo Alves, Ivaporunduva tem atualmente 16 jovens que foram beneficiados com bolsas de estudo e freqüentam o ensino superior à distância, além de outros quatro que já possuem diplomas e hoje trabalham “na comunidade e pela comunidade”.


“Esses jovens sabem que essa região é cobiçada pelas grandes indústrias. Mas sabem também que seus pais e avós lutaram bravamente para manter viva a história e a cultura do nosso povo. Por isso, em vez de tentar proibir, estamos certos de que a melhor opção é conscientizar essa geração para a necessidade de usarem o conhecimento adquirido no desenvolvimento e preservação da cultura quilombola”, alerta Alves. “E eles só podem fazer isso permanecendo aqui”.


O consumidor e as populações tradicionais


Veja algumas formas pelas quais o consumidor pode contribuir com a sobrevivência das comunidades tradicionais, como o quilombo de Ivaporunduva:


Uma forma direta de apoiar as comunidades tradicionais é comprando seus produtos. Muitas lojas em grandes centros disponibilizam produtos feitos de forma artesanal por essas comunidades ou por grupos de artesãos;


Veja os sites de três associações que trabalham com esses produtos:

Associação Ponto Solidário (http://www.pontosolidario.org.br/),

Associação Mundaréu (http://www.mundareu.org.br/)



Outra forma de colaborar é visitar as comunidades, adquirindo produtos cultivados, produzidos ou vendidos lá;


Ao visitar esses locais, é importante respeitar o patrimônio artístico, arqueológico, ambiental e cultural.



(Envolverde/Instituto Akatu)

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Ética e racismo ambiental


Por Robert Bullard - Sociólogo e Diretor do Environmental Justice Resource Center

O conceito “racismo ambiental” se refere a qualquer política, prática ou diretiva que afete ou prejudique, de formas diferentes, voluntária ou involuntariamente, a pessoas, grupos ou comunidades por motivos de raça ou cor. Esta idéia se associa com políticas públicas e práticas industriais encaminhadas a favorecer as empresas impondo altos custos às pessoas de cor. As instituições governamentais, jurídicas, econômicas, políticas e militares reforçam o racismo ambiental e influem na utilização local da terra, na aplicação de normas ambientais no estabelecimento de instalações industriais e, de forma particular, os lugares onde moram, trabalham e têm o seu lazer as pessoas de cor. O racismo ambiental está muito arraigado sendo muito difícil de erradicar.

A tomada de decisões ambientais muitas vezes reflete os acordos de poder da sociedade predominante e das suas instituições. Isto prejudica as pessoas de cor, enquanto oferece vantagens e privilégios para as empresas e os indivíduos das camadas mais altas da sociedade. A questão de quem paga e quem se beneficia das políticas ambientais e industriais é fundamental na análise do racismo ambiental.

O racismo ambiental fortalece a estratificação das pessoas (por raça, etnia, status social e poder), o lugar (nas cidades principais, bairros periféricos, áreas rurais, áreas não-incorporadas ou reservas indígenas) e o trabalho (por exemplo, se oferece uma maior proteção aos trabalhadores dos escritórios do que aos trabalhadores agrícolas).

Este conceito institucionaliza a aplicação desigual da legislação; explora a saúde humana para obter benefícios; impõe a exigência da prova às “vítimas” em lugar de às empresas poluentes; legitima a exposição humana a produtos químicos nocivos, agrotóxicos e substâncias perigosas; favorece o desenvolvimento de tecnologias “perigosas”; explora a vulnerabilidade das comunidades que são privadas de seus direitos econômicos e políticos; subvenciona a destruição ecológica; cria uma indústria especializada na avaliação de riscos ambientais; atrasa as ações de eliminação de resíduos e não desenvolve processos precautórios contra a poluição como estratégia principal e predominante. A tomada de decisões ambientais e o planejamento do uso da terra em nível local acontecem dentro de interesses científicos, econômicos, políticos e especiais, de tal forma que expõem às comunidades de cor a uma situação perigosa. Isto é particularmente verdade no Hemisfério Sul e, também, no Sul dos EUA, região que foi convertida numa “área de sacrifício”; um buraco negro para os resíduos tóxicos. Fora disso, ela está impregnada pelo legado da escravidão e pela resistência braça à justiça eqüitativa para todos.

O Hemisfério Sul (e também o Sul dos EUA) se caracteriza por políticas ambientais equivocadas e pela concessão de significativas deduções fiscais. A aplicação simplificada das normas ambientais deu lugar a que o ar, a água e a terra dessas regiões sejam mais contaminadas pelas indústrias, principalmente das multinacionais estadunidenses.

No Corredor Industrial do Baixo Mississipi, na Luisiana, têm-se estabelecido empresas petroquímicas que produzem agrotóxicos, gasolina, tintas e plásticos. Os ecologistas e os residentes locais o apelidaram de “Beco do Câncer”, sendo que os benefícios fiscais que recebem essas indústrias poluentes criaram poucos postos de trabalho para esses elevados custos. A revista Time denunciou que na Luisiana foram eliminados U$ 3,1 bilhões em impostos sobre propriedades de empresas poluentes. As cinco companhias mais poluentes receberam U$ 111 milhões em benefícios no último decênio. Este exemplo se aplica a inúmeras empresas dos países do Hemisfério Sul.

Existe uma correlação direta entre a exploração da terra e a exploração das pessoas. De forma geral, os indígenas são a parte da população que se defrontam com algumas das piores formas de poluição, entre elas a do mercúrio usado nos garimpos e as populações marginais que vivem perto dos lixões e aterros sanitários, incineradores e de outros tipos de operações perigosas praticadas pelas empresas mineradoras. A poluição industrial se manifesta também no aleitamento materno das mães das grandes cidades como São Paulo ou Nova Iorque. No caso dos EUA, as reservas dos indígenas norte-americanos, estão sendo sitiadas pelo “colonialismo radiativo”.

O legado do racismo ambiental institucional privou a muitas nações com grande número de indígenas de uma infra-estrutura econômica capaz de combater a pobreza, o desemprego, a educação e a atenção para a saúde e muitos outros problemas sociais. O racismo ambiental é evidente em escala mundial. O transporte de resíduos perigosos das comunidades ricas para as comunidades pobres não soluciona o crescente problema dos rejeitos em escala mundial. O transporte transfronteirizo de agrotóxicos proibidos, resíduos perigosos e produtos tóxicos e a exportação de “tecnologias perigosas” dos EUA – país onde a regulação e a legislação são rigorosas – para nações com uma infra-estrutura e uma legislação mais fracas, coloca em evidência a desigualdade normativa.

Os diferentes interesses e os acordos assinados pelos representantes do poder permitiram que as sustâncias venenosas dos ricos sejam oferecidas aos pobres como remédio de curto prazo para paliar a sua pobreza. Esta situação se observa tanto no plano nacional (nos EUA, onde as instalações dos resíduos e as indústria “sujas” afetam desproporcionadamente as comunidades de baixa renda e as pessoas de cor), como no plano internacional (onde os resíduos perigosos se transportam dos países membros da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico – OCDE aos Estados não pertencentes à mesma).

As pessoas de cor que se encontram em perigo nos países industrializados do Norte têm muito em comum com as populações dos países em desenvolvimento, que também estão ameaçadas pelas empresas poluentes. Por exemplo, grupos comunitários do Norco (Estado de Luisiana) e de Ogoni (Nigéria) identificaram a Shell como uma ameaça comum. Os ativistas da justiça ambiental têm se mobilizado em grupos dentro das cidades, bairros e vilas, desde Atlanta até o Equador; do Alaska até a África do Sul; das reservas dos indígenas dos EUA às selvas tropicais da Colômbia, El Salvador e do Brasil. Estes grupos têm se organizado, educado e empoderado a si mesmo, para desafiar o Governo e as empresas industriais poluentes.

O racismo ambiental se manifesta no trato desigual que recebem os operários. Milhares de trabalhadores do campo e as suas famílias estão expostos a perigosos agrotóxicos nas terras onde laboram. Igualmente eles são obrigados a aceitar salários e condições de trabalho inferiores ao nível médio. O racismo ambiental também se expande pelo entorno das funções exploradoras e escravizantes das empresas manufatureiras de roupa, da indústria microeletrônica e das indústrias extrativistas. Uma percentagem desproporcionadamente elevada de trabalhadores que se defrontam a condições trabalhistas e de segurança mínimas são imigrantes, mulheres e pessoas de cor.

Fonte: Revista Eco 21, ano XV, Nº 98, janeiro/2005.